segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Estendi-lhe o cesto, mas ao invés de segurar o cesto, segurou meu pulso: eu estava escondendo alguma coisa, não estava? (...) Enfiei a mão no bolso e apertei a folha, intacta a umidade pegajosa da ponta aguda, onde se concentravam as nódoas vermelhas. Ele esperava. Eu quis então arrancar a toalha de crochê da mesinha, cobrir com ela a cabeça e fazer micagem, hi hi! hu hu! Até vê-lo rir pelos buracos da malha, quis pular da escada e sair correndo em ziguezague até o córrego, me vi atirando a foice na água, que sumisse na correnteza! Fui levantando a cabeça. Ele continuava esperando, e então? No fundo da sala, a moça também esperava numa névoa de ouro, tinha rompido o sol. Encarei-o pela última vez, sem remorso, quer mesmo? Entreguei-lhe a folha.
In utero.

Tô abortando teu filho e parindo tua filha.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Ela chegou de mansinho, demasiado tarde, já passava das 23:00, mas mesmo assim sentou. Sentou na cadeira de couro (Como nos filmes antigos) abriu a bolsa, tirou o cigarro e acendeu. Ela tinha olhos de Capitu, cabelos pretos azulados longos, cara de quem conhecia muito da vida. Não, ela não conhecia nada da vida. Cardápio de hoje : Café e cigarros. 00:00. Tirou o telefone do gancho e ensaiou algo mecânicamente sincero como eu-sinto-sua-falta-você-vai-voltar ? Mas ao invés disso ficou ali,com o telefone na mão sem discar nenhum número, ensaiando palavras que nunca foram ditas.